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sábado, 25 de outubro de 2014

Passarinhando




A morte é uma grande incógnita.

Gerações e gerações, milênios e milênios de gentes buscando meios de superá-la - sem sucesso.


 Tantas religiões e preces, possessões e exorcismos, desejos de vidas depois de vidas que se enfileiram, que se completam. Tudo ainda é um grande emaranhado de expectativas e ânsias desorganizadas e não estamos mais perto de entender agora do que estávamos há dois mil anos.

Ontem eu vi um passarinho morto.

Eu queria fazer uma introdução bonita e falar filosoficamente sobre a morte e citar uma centena de autores que obviamente entendem disso muito melhor do que eu, mas achei melhor tentar falar por mim, do único jeito que sei: ontem eu vi um passarinho morto e o seu corpinho infestado de formigas me doeu como o diabo.

As peninhas amarronzadas em farrapos. Eu, que nunca gostei de marrom, de repente me vi apaixonada. O biquinho entreaberto, os olhinhos que não estavam mais lá, os pezinhos já meio comidos. Um buraco feio na barriga. O cadaverzinho, já meio apodrecido, parecia que fazia troça de mim.

Encarei-o longamente, segurando minha bolsa contra o peito. Todas as minhas teorias caem por terra quando eu me deparo com algo assim tão empírico. Tanto tesão de voar tão alto - tudo isso interrompido. Não sei bem como ele se foi, mas imagino algo como: ele abrindo as suas asinhas, sentindo o vento paulistano (que não é lá dos melhores ventos do mundo, mas) contra sua frágil estrutura, sentindo que nossa, há tanto para se explorar e que bênção é estar vivo e de repente o breu. Nada mais. Nenhuma cantiga, nenhum colo de entidade compadecida, só o escuro. Que coisa triste para um pardalzinho sumir assim. Num universo não tão paralelo, esse pardalzinho podia ser eu.
Atravessei a rua com o peito em chamas. De trás de mim, jurei ouvir um assobio. Certamente que não era do bichinho. Não poderia ser.
Hoje a gente começou uma nova sessão do Apenas 1 Cast chamada #convidados. Começamos com J. que é carioca na certidão e paulistana de coração. Uma apaixonada pela liberdade que tem medo de avião e nutre uma paixonite por cães, cinema e teatro. Sonha em fazer um filme, ter um canil, escrever um livro e envelhecer como a Angelina Jolie e sempre quis encerrar um discurso de formatura com um grito de “eu estou grávida de Luis Carlos Prestes!”. Escreve no blog As Flores do Mal há quatro anos e pode ser encontrada aqui: http://spleenitique.wordpress.com